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segunda-feira, 11 de junho de 2012

Sobre Xuxa, abusos, violência, midia e alguma felicidade.

Quando o Silêncio é a Melhor Alternativa

Heloisa Lima- Psicóloga Clínica

Não vi a comentada entrevista da Xuxa no Fantástico, mas não pude ignorá-la porque em seguida, de forma repetitiva, fui várias vezes indagada a respeito no tocante ao abuso sexual por ela sofrida em sua infância.

Excetuando o surrealismo da revelação, ocorreu-me que aquela, certamente, não era a notícia que desejava ouvir logo no início da semana porque afinal, como uma mulher de 50 anos de vida, aparentemente esclarecida, só agora, passado tanto tempo, resolveu falar a respeito de algo tão grave ?

Parei para refletir e confesso não foi difícil descobrir, isto devido a Xuxa, lá pelo seus primórdios, ter vivido no mesmo condomínio do meu irmão, no Grajaú, RJ.

Lembro-me de minhas sobrinhas, ensandecidas, indo buscar as grotescas sandalinhas cheias de brilho no apartamento dela, na esperança em encontrar com o Pelé que, virava e mexia, dava as caras por lá.

Desde os seus 20 e poucos anos, ela comandou programas infantis cuja tônica foi erotizar precocemente crianças, transformando meninas em arremedos de mulheres sem se preocupar com sua vulgarização.

Esses programas por ela comandados sempre tiveram como mote atropelar o desenvolvimento infantil em sua exuberância, repletos de etapas simbólicas, pasterizando os encantos dessa fase e empenhando-se em exaltar a diferença entre possuir e não possuir os produtos que anunciava ou que levavam sua grife, tais como sandálias, roupas, maiôs, lingeries, xampus, bonecas, chicletes, cosméticos, álbum de figurinhas, cadernos, agendas, computadores, sopas, iogurtes e muito mais, tudo reunido em um universo insano onde ela, a Xuxa, eternamente fantasiada de insinuante ninfeta, fazia biquinhos e comandava a miúda plebe ignara.

Cientes estamos todos de que a Xuxa, durante muitos e muitos anos, defendeu zelosamente seu polpudo patrimônio, utilizando-se da fachada de menina meio abobada que sequer sabia quantos milhões possuía.

Costumava dizer que era a sua empresária, de nome Marlene, que administrava suas posses materiais, cujo montante alegava, candidamente, desconhecer.

Pobre menina rica, e burra com certeza, como se fosse possível alguém tão tapada tornar-se tão rica.
Talvez para esconder a consciência que tinha acerca do quanto ajudou a devastar a inocência de tantas gerações de menininas que lhe devotavam a mais pura idolatria, posou de inocente útil usando a mesma máscara que agora reedita para falar, emocionada, do seu mais novo pretenso drama que, em síntese, constitui mais uma jogada de marketing.

Esqueceu-se que sua audiência, formada na sua massacrante maioria por meninas, passou a ser considerada como alvo da desumana propaganda, colocando-as como mero veículo de consumo.

Esqueceu-se, convenientemente, de comentar que milhares de garotas pelo Brasil inteiro foram abusadas sexualmente no mesmo tempo em que eram, por ela, adestradas a vestir e comportarem-se como verdadeiras lolitas.

Esqueceu-se de que ensinou atitudes claramente ambivalentes para crianças que não faziam a mais pálida idéia do que podiam mobilizar em mentes doentias.

Esqueceu-se de que a erotização tem sido ligada a três dos maiores problemas de saúde mental de adolescentes e mulheres adultas: desordens alimentares, baixa auto-estima e depressão.

Esqueceu-se também que as crianças, diariamente bombardeadas com imagens de paquitas como modelos de uma beleza simplesmente inalcançável enquanto corpos reais, torturavam-se perseguindo um modo de serem belas, perfeitas, saudáveis e eternas.

Estimulando a sexualidade de forma tão precoce, essas meninas perderam grande e preciosa fase do seu desenvolvimento natural com a redução do período da inocência, o que acarretou-lhes desdobramentos nefastos.

Daí a idéia, cada vez mais presente, da infância como objeto a ser apreciado, desejado, exaltado, numa espécie de pedofilização generalizada na sociedade, o que se constituiu apenas em um pequeno passo.

Num país onde as mães deixam suas crias, por absoluta falta de opção, em frente à televisão sem qualquer tipo de controle e sem condições para discutir o conteúdo apresentado, encontrou a Xuxa terreno mais que propício para disseminar sua perversa e desmedida ganância por audiência e dinheiro.

Fosse ela uma mulher minimamente preocupada com a direção que a sexualidade exacerbada e fora de contexto toma neste país onde mulheres são cotidianamente massacradas, teria falado sobre este suposto drama muito tempo atrás.

Teria tido muito mais cuidado com os exemplos de exposição que passava.

Teria norteado seu trabalho dentro de parâmetros muito mais educativos e, dessa forma, contribuído para que milhares de meninas fossem verdadeiramente cuidadas e respeitadas.

Ou teria simplesmente virado às costas e ido embora.

Logo, frente ao seu histórico, não tem mesmo nenhuma autoridade para sustentar qualquer atitude fundamentada em belos e necessários méritos porque, são de grandes valores, bons princípios e atitudes exemplares, que a nossa sociedade necessita de maneira URGENTE.

Portanto, cale-se, XUXA !!!!!!!!!!!!



PS: Posso não concordar inteiramente com o que uma falou e com o que esta esta escrevendo sobre o que ele falou, foi e é. Mas vou sempre defender o direito de ambas se expressarem.  De qualquer forma, reproduzi aqui este artigo, pois achei válido como elemento de análise nestes temos de "mudernidade".  As "crianças da Xuxa" estão ai hoje, muitas das quais já mães e, talvez seus filhos, estejam assistindo ao "Planeta Xuxa" numa destas tardes de sábado não tanto, hoje, por falta de opção, mas como uma opção entre tantas das TVs abertas ou fechadas, feitas com a sonorização da mediocridade, da banalização da arte e da idiotização generalizada das crianças que já não tem mais espaços para brincar e se divertir para além das portas de suas casas e, dentro delas, ficam reféns do computador ou da TV.   Não sei se minha geração teve infância mais feliz que a de hoje (a cada tempo é dada uma felicidade), mas tinhamos mais espaço fisico para expandir nossa alegria e ela era menos condicionada por terceiros, do que é hoje. A felicidade destes tempos de consumismo absoluto parece ser aquela que a publicidade midiática mostra nas vitrines das lojas. Pode ser comprada em prestações e com crédito "facilitado" pelo governo. 

2 comentários:

  1. Reproduzo o comentário que postei no blog da referida psicóloga: "Gostaria de lhe fazer duas perguntas: (1) se a Xuxa aparecesse em seu consultório, como paciente, a sua maneira de lidar com a situação seria a mesma? e (2) se ao invés de ser milionária ela fosse pobre a sua indignação teria o mesmo tamanho? Preocupa-me o fato de, como psicóloga, em nenhum momento ter demonstrado em suas palavras qualquer empatia por uma pessoa que foi "abusada sexualmente". Talvez devesse refletir sobre qual a verdadeira razão que motivou a sua indignação. Para mim a agressividade do conteúdo do seu texto e a completa falta de empatia por uma "vítima" foram muito mais chocantes do que qualquer programa da Xuxa, principalmente por saber que a senhora lida com cabeças humanas e, ao divulgar textos, está a formar opiniões. Espero, sinceramente, que não partilhe da opinião de que mulheres estupradas são culpadas se estiverem a usar roupas que mostrem o corpo porque os tarados não podem controlar seus instintos. Eu, particularmente, nunca vi erotização nos programas da Xuxa. É normal crianças usarem pouca roupa, maquiarem-se, usarem sandalinhas bonitas ou esmaltes. Para elas isso é como outra atividade lúdica qualquer. Normalmente a "sujeira" está na mente de quem vê. Mesmo essas pessoas que erotizam crianças (pedófilos, consumados ou não) foram, com frequência, vítimas de abuso sexual e, portanto, são dignas de compaixão e tratamento como quaisquer das crianças que a senhora trata em seu consultório. Peço-lhe, por favor, que reveja seus conceitos, pois os seus pacientinhos de hoje podem, daqui a alguns anos, tornar-se vítimas da sua violência verbal! Não me leve a mal, eu não conheço a Xuxa nem tampouco alguém que seja pedófilo, mas não dormiria tranquila se não fizesse este comentário, pela única razão de que a senhora é uma psicóloga. Por sua foto, você realmente parece uma boa pessoa e, tenho certeza de que o seu texto foi escrito com a melhor das intenções!"

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  2. Adorei teu comentário e assino embaixo.

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