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domingo, 28 de outubro de 2012

Algumas consideraçoes sobre crimes de corrupção eleitoral

A propósito da denúncia de abuso de poder político, econômico e condicionamento de voto de eleitores, em Estância Velha, conforme reportagem veiculada pelo SBT/RS, nesta semana.


Compra de votos (art. 299, CE) x captação ilícita de sufrágio (art. 41-A, LE) x abuso do poder econômico (art. 14, § 10, CF)

 

    É importante estabelecer as diferenças existentes entre o crime de compra de votos do art. 299 do Código Eleitoral; a conduta administrativo-eleitoral ilícita denominada captação ilícita de sufrágio, prevista no art. 41-A da Lei 9.504/97; e a causa de inelegibilidade abuso de poder econômico, contida no art. 19 Lei Complementar 64/90.
    O crime do art. 299 previsto no Código Eleitoral (Lei n.º 4.737/65) possui um espectro mais amplo que a conduta prevista no art. 41-A; todavia, lhe falta eficácia, e isto tendo em vista que o crime do art. 299 corre pelo rito ordinário da Justiça Eleitoral, e as condutas do art. 41-A pelo procedimento da investigação judicial eleitoral. Foi exatamente por tal motivo que a Lei n.º 9.840/99 introduziu esse dispositivo em nossa legislação, com a intenção de proporcionar eficácia ao crime de compra de votos previsto no art. 299 do Código Eleitoral [01].
    Os dois dispositivos possuem, de fato, redações bastante parecidas, o que não quer dizer, todavia, que a disciplina da captação ilícita de sufrágio tenha revogado o crime da compra de votos, podendo, inclusive, a conduta de "dar, oferecer, prometer ou entregar, ao eleitor, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, com finalidade de obter-lhe o voto" ser tipificada tanto como crime eleitoral (art. 299, Lei 4.737/65) quanto como infração eleitoral (art. 41-A, Lei 9.504/97). Nesse caso, o agente pode sofrer um processo na esfera criminal eleitoral, e outro no campo da representação pelo rito da investigação judicial eleitoral [02].
    Ressalta ainda Olivar Coneglian que talvez o único ganho significativo, e almejado pelos autores da lei, seja o tempo de duração do processo, uma vez que o rito da investigação judicial eleitoral mostra-se mais eficiente que o rito ordinário. Todavia, no que tange aos sujeitos destinatários das normas, o art. 41-A considera como agente do ilícito apenas o candidato comprador, não havendo punição alguma em face do eleitor que vendeu o voto, a contrário do art. 299, que pune do mesmo modo comprador e vendedor.
    Diferem-se ainda quanto ao tempo de caracterização da conduta. Na captação ilícita de sufrágio, a conduta só é ilícita se ocorrer entre o registro da candidatura e o dia da eleição, sendo que na compra de voto, o crime pode ser configurado mesmo antes do registro, até o dia da eleição.
     Ademais, a ofensa ao art. 41-A pode caracterizar infração eleitoral, passível de sanção pecuniária e de cassação de registro ou diploma do candidato. Já o art. 299 constitui crime, sendo punido com pena de reclusão de quatro até anos [03].
     No que tange ao abuso do poder econômico, este se diferencia dos demais por diversos fatores.
Um deles é em razão de constituir-se numa causa de inelegibilidade. Assim, se condenado o candidato por incurso em abuso do poder econômico, terá o registro de candidatura ou o diploma cassado, ficando inelegível o candidato até as eleições que se realizarem nos 3 (três) anos seguintes àquela que foi condenado (LC 64/90, art. 1º, I, "d") [04].
     Outra distinção que se faz entre a captação ilícita de sufrágio, o crime do art. 299 do CE e o abuso do poder econômico é que, naqueles, não se mostra necessária a comprovação da potencialidade da conduta em influir no resultado do pleito, uma vez que o bem jurídico que se pretende tutelar é outro, qual seja, a liberdade de escolha do eleitor. Já quando se está diante de abuso de poder econômico, mister se faz a demonstração de que a conduta teve potencialidade em interferir no resultado do certame, haja vista que o bem jurídico protegido é a própria normalidade e legitimidade das eleições [05].
    No mesmo sentido, Mauro Almeida Noleto ensina:
Para a caracterização do ilícito do art. 41-A, a jurisprudência, desde o início de sua aplicação, entendeu não ser necessário aferir-se a potencialidade de a conduta praticada provocar o desequilíbrio na disputa e com isso afetar o resultado da eleição. Isso porque o bem jurídico protegido pelo 41-A seria a liberdade de escolha do eleitor e não a normalidade e o equilíbrio da disputa. Assim, bastaria a comprovação da ‘compra’ de um voto (promessa, oferta, doação ou entrega de bens ou vantagens em troca do voto) para se alcançar a punição do candidato. [06]
   Em síntese, a compra de votos é prevista no art. 299 do Código Eleitoral é um crime eleitoral, punida com reclusão de até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa e corre pelo rito ordinário da Justiça Eleitoral; o bem jurídico tutelado é a liberdade de sufrágio do eleitor, pelo que se pode identificar o eleitor beneficiário.
   A captação ilícita de sufrágio, do art. 41-A da Lei das Eleições, é um ilícito administrativo eleitoral, sancionado com multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64/90. O bem jurídico tutelado é a liberdade de sufrágio do eleitor. Aqui também se pode identificar o eleitor que vendeu o voto, mas não há previsão legal para puni-lo.
     No abuso de poder econômico nas eleições, o bem jurídico não é a simples liberdade de sufrágio do eleitor, mas a normalidade e legitimidade do próprio processo de escolha dos representantes contra qualquer conduta que demonstre potencialidade de desigualar o pleito, podendo ter como sanção a inelegibilidade do candidato por até 3 anos, não sendo possível a identificação do eleitor que trocou seu voto por determinado bem, considerada a massa de eleitores envolvidos.

Notas

  1. CONEGLIAN, Olivar. Propaganda eleitoral: de acordo com o Código Eleitoral e com a Lei 9.504/97, modificada pelas Leis 9.840/99, 10.408/02 e 10.740/03. 6. ed. Curitiba: Juruá, 2004, p. 117.
  2. Ibidem, p. 117-119.
  3. Ibidem, p. 118-119.
  4. CASTRO, Edson de Resende. Teoria e prática do direito eleitoral. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 248.
  5. Ibidem, p. 248.
  6. NOLETO, Mauro Almeida. Op. cit., p. 112.

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