Pesquisar este blog

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

A propósito de conceitos de Ética

O filósofo Imanuel Kant tem como propósito estabelecer uma ética racional. Ou seja, uma ética que possa ser efetivamente implementada pelos seres humanos racionalmente, independente da fé e da revelação divina. Em seu livro Crítica da Razão Pura, Kant analisa os limites da razão humana. Ele conclui que as três coisas que envolvem nossas preocupações morais, Deus, a alma imortal e a liberdade, podem apenas serem pensadas e não conhecidas efetivamente. A nossa razão, portanto, não consegue objetivamente conhecer os objetos que correspondam aos conceitos pensados: "Deus", "alma imortal" e "liberdade". Deste modo, Kant vê a necessidade de ultrapassar o uso reflexivo e intelectual que fazemos da razão para uma razão que também tenha um uso prático. A isto Kant chamou de "razão prática". Portanto se não é dado conhecermos estes três conceitos intelectualmente e para não aceitá-los dogmaticamente, é necessário os justificar e os fundamentar através da razão prática. É inerente a razão prática admitir a realidade da liberdade, da alma imortal e de Deus. Disse Kant: "Fui obrigado, portanto, a suprimir o saber para dar lugar à fé". Mas nesta frase a "fé" pressupõe uma fundamentação pela razão prática e não pela revelação e crença.

A Ética kantiana é fundamentada pela "razão prática" e pela "liberdade".

A diferença entre a razão teórica e a razão prática é que, a primeira visa, através da especulação ou investigação reflexiva, o conhecimento, e a segunda visa o agir. Para que o homem realize o seu desejo inato de ser feliz, ele terá que agir em sociedade com prudência, isto é uma necessidade. Em função disto, a pergunta "o que devo pensar para ser feliz?" não é suficiente para realizar a felicidade, é necessário se perguntar também "o que devo fazer para ser feliz?". Observar que para Kant os três objetos "Deus", "a alma imortal" e "a liberdade" são o "fim final" para ser feliz. Ora, se as leis da natureza são todas necessárias, ou seja, todo fenômeno tem uma causa necessária, de outro modo, para cada efeito há uma causa, como pode existir a liberdade, que significa a total falta de necessidade?

Kant irá dizer que a liberdade é espontaneidade absoluta, ou seja desvinculada de qualquer causa a priori. Ela não é uma liberdade apenas em pensamento (imaginação) e também não é uma liberdade que se coloca como que para ficar livre das coisas ruins (psicológica).

Para estabelecer sua Ética, Kant parte de dois pressupostos para ele essenciais:
1º . O ponto de partida de toda reflexão ética é o conceito de "boa vontade", ou seja, sinceramente, devemos ter uma vontade de atingir o bem. Esta intenção traduz-se em uma "boa vontade". Não é portanto atingir a felicidade através dos prazeres, os instintos humanos dão conta deste tipo de felicidade.
2º. A ação moral deve ser realizada "por dever", ou seja, dever num sentido moral é o dever que respeita uma lei moral. Portanto, a ação moral é realizada cumprindo-se uma lei moral que é inerente ao ser humano sem nenhuma causa que a motive, sem nenhum fenômeno que a fundamente. A lei não fenomênica, a lei é nomênica.

Pode-se perceber que a Ética e a liberdade em Kant são interdependentes. E a perfeição moral, por exemplo, a ética de um homem santo, é um atributo de uma vontade livre, que é capaz de agir segundo a lei moral. Esta lei é chamada de imperativo categórico, e ela é expressa por Kant de quatro maneiras diferentes:

 "Age somente segundo uma máxima por meio da qual possas querer ao mesmo tempo que ela se torne lei universal."
 "Age de tal maneira que a máxima de tua vontade possa valer igualmente em todo tempo como princípio de uma legislação universal."
 "Age de tal sorte como se a máxima de tua ação devesse tornar-se, por tua vontade, lei universal da Natureza."
 “Age de tal maneira que trates sempre a humanidade, tanto em tua pessoa quanto na de qualquer outro nunca simplesmente como meio, mas ao mesmo tempo e simultaneamente como fim."

O imperativo categórico assemelha-se a lei áurea bíblica: "Não faças com os outros aquilo que não queres que façam contigo."

A ética kantiana é pautada por uma "vontade livre" que significa a autonomia da vontade, este é o princípio supremo da moralidade ou da eticidade. Uma vontade autônoma adota o imperativo categórico como o único modo de atingir a moralidade. Uma vontade heterônoma está sujeita às vicissitudes da vida, ela "é a fonte de todos os princípios ilegítimos." Portanto, "a vontade autônoma é uma causalidade dos seres racionais e a liberdade é a propriedade dessa causalidade pela qual ela pode agir independentemente de causas externas que a determinem."

Concluindo, Marilena Chauí diz: "A razão prática é a liberdade como instauração de normas e fins éticos. Se a razão prática tem o poder para criar normas e fins morais, tem também o poder para impô-los a si mesma. Essa imposição que a razão prática faz a si mesma daquilo que ela própria criou é o dever. Este, portanto, longe de ser uma imposição externa feita à nossa vontade e à nossa consciência, é a expressão da lei moral em nós, manifestação mais alta da humanidade em nós. Obedecê-lo é obedecer a si mesmo. Por dever, damos a nós mesmos os valores, os fins e as leis de nossa ação moral e por isso somos autônomos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário